Estamos assistindo a uma discussão insensata — decorrente da crise de gestão do setor público que vem paralisando o país — entre membros do governo, ambientalistas e empresários, sobre o que vem antes: o ovo, a galinha ou, quem sabe, o ovo não fecundado ou a galinha estéril.
O conceito de desenvolvimento sustentável é fundamental para adequar o modelo econômico e permitir que, no futuro, o vetor ambiental, o social e o econômico se fundam numa resultante que garanta melhor qualidade de vida às novas gerações.
Ou, na pior das hipóteses, a mesma que nós usufruímos.
O Brasil tem vocação para implementar esse conceito, antecipando-se à maior parte dos países e, sem dúvida, a todos os países emergentes. O progresso, que legitimamente a presente geração deve buscar, não pode ser alcançado à custa da degradação dos recursos naturais por ela recebidos.
Para alcançar o desejável equilíbrio entre as necessidades do presente e as potencialidades do futuro, a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS) entende que a atual legislação ambiental brasileira é contraditória, repetitiva, dificulta sobremaneira a implementação de projetos essenciais e, portanto, necessita de aperfeiçoamentos.
Em primeiro lugar, o governo federal deve ser o único ente federativo com a responsabilidade de avaliar a viabilidade ambiental e social de empreendimentos cujos efeitos — positivos ou negativos — ultrapassem as fronteiras estaduais.
Não deveria ser possível decidir o licenciamento de alguma infraestrutura — uma usina hidrelétrica, por exemplo — levando-se em consideração, exclusivamente, os impactos locais, em geral negativos. É preciso considerar, também, as alternativas e os trade-of f. Por exemplo, seria preferível gerar eletricidade queimando combustíveis fósseis? Ou ainda, o país está disposto a limitar a oferta de eletricidade para milhões de brasileiros, espalhados por todo o território nacional? Isso não significa que os impactos sociais e ambientais negativos devam ser ignorados. Ao contrário, devem ser assumidos e compensados pelos empreendedores.
Não há nada que o homem faça, inclusive caminhar sobre a grama, que não produza impacto ambiental.
No entanto, esse impacto pode sempre ser corrigido através de compensações que, eventualmente, podem até aumentar o ativo ambiental.
Em segundo lugar, os servidores públicos, do Ibama ou de qualquer outra agência ambiental, não devem temer punição por suas decisões, quando escudadas na lei e tomadas sem dolo.
Lamentavelmente, hoje há um forte incentivo para que os tomadores de decisão se abstenham de decidir, pois, com freqüência, se tornam alvo de processos na Justiça. Os funcionários públicos na área de meio ambiente se sentem submetidos a essas pressões e se retraem às críticas patrocinadas por variados interesses, nem sempre legítimos e muitas vezes mal informados.
Essa situação tem feito com que o empresariado, a mídia e a classe política desenvolvam crescente percepção de que a preocupação ambiental dificulta a implantação dos projetos de infra-estrutura e, conseqüentemente, freia o desenvolvimento do país.
Não podemos ser surpreendidos com alguma decisão aleatória do Congresso Nacional. Por exemplo, pela iniciativa de algum parlamentar mais afoito que proponha projeto de lei para revogação pura e simples da legislação relacionada à proteção ambiental.
Freqüentemente as dificuldades encontradas pelos grandes projetos de infra-estrutura decorrem da falta de uma visão holística. Por exemplo, durante anos foi negada a licença ambiental para a construção do gasoduto Coari-Manaus. Nossa primeira reação seria de defesa dessa resistência: não há como refrear a antipatia à proposta de esticar tubulações no seio da floresta virgem. E ninguém mais do que nós deseja a preservação da Floresta Amazônica.
No entanto, é forçoso concluir que o gasoduto eliminaria o atual uso de óleo para geração de energia elétrica em Manaus. Cerca de 400 mil toneladas de dióxido de carbono deixariam de ser lançadas na atmosfera por ano, apenas com a troca de óleo por gás natural, com efeito benéfico sobre o efeito estufa. Ou seja, sob a ótica ambiental não é óbvio que a proibição do gasoduto seja a melhor decisão.
Se fosse adicionada a dimensão econômica, a oposição ao gasoduto ficaria ainda mais frágil. Só em 2005, se tivesse sido utilizado gás natural em lugar de óleo, a economia seria de R$ 1,2 bilhão. A maior parte desse desperdício foi paga por cobrança embutida na conta de luz dos consumidores de todo o país. Com esse montante teria sido possível reflorestar 225 mil hectares na faixa degradada da Amazônia, gerar crédito de carbono e resolver grave problema social, por meio da criação de milhares de empregos.
Como costuma dizer a ministra Marina Silva: “Não basta dizer não pode. É preciso dizer como pode.” Essa atitude ética nos inspira. Olhamos os rios e as florestas e desejamos que estejam disponíveis para as próximas gerações.
Olhamos para as dificuldades dos pobres da presente geração e desejamos que consigam emprego e melhor qualidade de vida. Buscar o equilíbrio entre esses dois olhares é a principal responsabilidade dos que defendem o desenvolvimento sustentável.
ISRAEL KLABIN, PHILIPPE REICHSTUL, MARIA SILVIA BASTOS MARQUES, RUBENS RICUPERO e JERSON KELMAN são membros do Conselho Curador da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FDBS).
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Um comentário:
Um, esta frente tem algo a ver com o FEBEAPA?
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