10 novembro 2006

Privilégio para quem não merece: Supremo dividido decide desmembrar o inquérito que investiga o Mensalão

Por Jorge Serrão

O Supremo Tribunal Federal resolveu desmembrar o inquérito que investiga os 40 denunciados no escândalo do Mensalão pelo Procurador Geral da República, Antônio Fernando de Souza. A medida beneficia os “mensaleiros”, denunciados no último dia 30 de março, pois a maioria será investigada pelo próprio Supremo, com todas as vantagens do foro privilegiado – e não de um tribunal comum, como qualquer mortal que cometa um delito. Acontece que o feitiço também pode virar contra o feiticeiro, pois um julgamento do STF não cabe recurso, diferentemente do processo em primeira instância judicial.

A decisão do Supremo pelo desmembramento foi polêmica e apertada. Venceu por 6 votos a cinco, graças ao voto de Minerva da presidenta Ellen Gracie. A tese vencedora foi do ministro Sepúlveda Pertence. O desmembramento ocorrerá apenas nas hipóteses em que não haja co-autoria de crime com detentores de prerrogativa de foro privilegiado. Mas o caso volta ao plenário do STF na próxima semana para que seja decidido quem fica no Supremo e quem vai para a primeira instância. Um dos perigos do desmembramento é que o processo pode comprometer a apuração dos fatos e gerar decisões contraditórias sobre a mesma denúncia.

O ministro Joaquim Barbosa, indicado para o STF na gestão Lula, foi designado pelos onze ministros do supremo para fazer a proposta de desmembramento. O inquérito do Mensalão reúne 40 pessoas, entre políticos e empresários, denunciados por mais de seis crimes, entre eles, peculato, corrupção, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, evasão de divisas e gestão fraudulenta. Um dos acusados de comandar o esquema, José Dirceu, deve ser julgado pelo Supremo, por ser ex-ministro. Mesmo destino terão o deputado eleito José Genoino (PT-SP), e os parlamentares João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e João Magno de Moura (PT-MG). Não se sabe se o mesmo ocorrerá com outros importantes operadores, como o publicitário Marcos Valério (aquele que só Deus sabe por que ninguém pede sua prisão) e o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares.

O Voto de cada um

No julgamento, Joaquim Barbosa defendeu o desmembramento e foi acompanhado pelos ministros Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso e Marco Aurélio e, em parte, pelo ministro Sepúlveda Pertence.

O ministro Gilmar Mendes, que votou pelo não desmembramento do processo, reclamou da “perda de tempo” do plenário em discutir a questão de ordem levantada pela relator, que era justamente o desmembramento ou não do processo.

Para Gilmar, o número excessivo de réus não pode ser motivo para o desmembramento do processo neste caso.

De acordo com o ministro a denúncia da Procuradoria Geral da República mostra uma teia de fatos complexos que não podem ser analisados em separado.

A divergência foi aberta pela ministra Cármen Lúcia, defendendo que a instrução não poderia perder a conectividade.

Acompanharam seu voto os ministros Eros Grau, Celso de Mello, Gilmar Mendes, e a presidente da Corte, ministra Ellen Gracie que acabou votando para o desempate.

A organização criminosa

De acordo com a denúncia do procurador-geral, o esquema do mensalão era uma organização criminosa dividida em três núcleos: o político-partidário, o publicitário e o financeiro.

O núcleo político partidário (composto por José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e Silvio Pereira), que era o responsável por repassar as diretrizes de atuação para os outros dois núcleos, pretendia garantir a permanência do Partido dos Trabalhadores no poder com a compra de suporte político de outros partidos (PP, PL, PTB, PMDB) e com o financiamento irregular de campanhas.

O segundo núcleo — composto por Marcos Valério, Rogério Tolentino, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Simone Vasconselos e Geiza Dias — era responsável por receber vantagens indevidas de integrantes do governo federal e de contratos com órgãos públicos (como por exemplo os contratos de publicidade da Câmara dos Deputados, do Banco do Brasil e da Visanet).
O terceiro núcleo — composto por José Augusto Dumont, Kátia Rabelo José Roberto Salgado, Ayanna Tenório e Vinícius Samarane — atuou na organização criminosa em busca de vantagens indevidas e facilitava as operações de lavagem de dinheiro.

De acordo com a denúncia do procurador, para garantir apoio no Congresso, ajudar na eleição de aliados e fazer caixa para novas campanhas, o estado-maior do PT desembolsava altas quantias aparentemente recebidas em troca de favorecimento da máquina pública.

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