29 outubro 2006

Pequeno dicionário da eleição 2006

Eduardo Nunomura

O que interferiu na disputa entre o petista Luiz Inácio Lula da Silva e o tucano Geraldo Alckmin? De A a Z, eis abaixo um pequeno dicionário da campanha de 2006. Temas que começaram a ser discutidos, a bem da verdade, desde junho do ano passado, quando o então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) detonou a crise do mensalão. De lá para cá, a eleição ganhou novos contornos e a história política, verbetes inéditos.
A
Aloprados - os muy amigos do presidente Lula, que armaram a compra por R$ 1,75 milhão de um dossiê anti-Serra às vésperas do primeiro turno. Juram que queriam ajudar, mas isso é a mesma coisa que o Schumacher dizia para Rubens Barrichello
Aerolula - um Airbus 319 comprado para ser o avião presidencial no ano passado por US$ 56,7 milhões. Lula viajou nele o quanto pôde. Já Alckmin disse que vai vendê-lo para construir cinco hospitais
B
Blogs - nunca (“antes na história deste país”) houve uma eleição com tantas fontes de informação. Jornais, rádios e TVs tiveram de suar para concorrer com blogs de jornalistas e políticos
Bolsa-Família - é o maior programa social para famílias de baixa renda do mundo ou uma grande estratégia eleitoreira? Na dúvida, os candidatos só falaram em manter, melhorar e expandir o programa
C
Caixa 2 - tudo o que os políticos e faturam por fora. Em famosa entrevista na França, Lula definiu: “O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente.”
Caseiro - ou Francenildo dos Santos Costa, o caseiro da mansão freqüentada pelo ex-ministro Antonio Palocci que denunciou ao Estado a realização de reuniões, festas e encontros com mulheres. A casa do Lago Sul foi alugada pelos amigos de Palocci, Rogério Buratti, Ralf Barquete e Vladimir Poleto, todos da república de Ribeirão Preto. Para desacreditá-lo, houve uma operação para quebrar o sigilo bancário do caseiro. O ministro acabou caindo
CPIs - provaram que havia corrupção financiada por recursos públicos e privados. Só sobre o mensalão, foram três comissões: dos Correios, dos Bingos e do Mensalão. No final, só três deputados perderam o mandato - José Dirceu, Roberto Jefferson e Pedro Corrêa
D
Dança da pizza - a deputada petista Ângela Guadagnin debochou do público com uma dança esquisita para celebrar a impunidade de um mensaleiro. Foi banida pelas urnas
Delúbio - ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares transformou o PT num dos partidos mais ricos do País. Acusado de ser o responsável pela distribuição do mensalão aos deputados. Afirmou que era tudo “recurso não-contabilizado” e deixou como herança um partido afundado em dívidas financeiras
Dólares na cueca - assessor do irmão do deputado José Genoino, José Adalberto Vieira da Silva foi flagrado ao tentar embarcar com US$ 100 mil na cueca. Preso, saiu-se com essa: o dinheiro era da venda de verduras
Dossiê Vedoin - tema que dominou a campanha eleitoral, derrubou a direção do PT, prometia prejudicar as campanhas do PSDB, mas nunca existiu de verdade
Duda Mendonça - o publicitário, que gosta de uma briga de galo, confessou ter recebido R$ 10 milhões do valerioduto numa conta bancária em Miami por meio de uma offshore nas Bahamas
E
Eduardo Azeredo - usou o valerioduto antes mesmo do PT, em Minas. Foi perseguido pelos inimigos e nem os amigos o pouparam: “Erramos no início, quando quisemos tapar o sol com a peneira no caso do senador Azeredo”, declarou FHC
F
Freud Godoy - barba por fazer, bituca de cigarro na mão, o ex-assessor do presidente, quando foi depor sobre o envolvimento com o dossiê Vedoin, fez o contrário do que o seu xará famoso fazia: Freud não explica
G
Garotinho - saiu do ostracismo do 1º turno para abrir a primeira crise do 2º turno, num abraço dado ao tucano AlckminHHeloísa Helena - ex-petista, candidata pelo PSOL, a senadora foi pródiga em criar apelidos para o presidente, seu alvo preferido na campanha. Referia-se a Lula como “sapo barbudo”, “majestade barbuda” ou “rei da abobrinha”. Quanto a Alckmin, usava mesmo o “picolé de chuchu”
I
Impeachment - a oposição preferiu deixar o presidente Lula “sangrar” em vez de embarcar num pedido de impeachment. Só se arrependeu quando já era tarde
J
Jefferson - Ex-deputado federal do PTB, Roberto Jefferson foi envolvido em denúncias de corrupção. Abandonado pelo governo Lula, resolveu entregar o esquema de pagamento de mensalão aos deputados. De homem-bomba, acabou detonado. Também será lembrado por sua performance como cantor de churrascaria
Juscelino - Juscelino Kubitschek virou sonho de consumo dos políticos, todos queriam ligar sua imagem à do ex-presidente que ergueu Brasília. Lula foi além. Também se comparou a Getúlio Vargas, Gandhi, Tiradentes e Jesus Cristo
L
Land Rover - acusado de operar o mensalão e ter influência na distribuição de cargos, o então secretário-geral petista Silvio Pereira caiu por ter recebido um jipão de R$ 70 mil da empresa GDK
Leblon - lulistas e alckmistas disputaram a tapa cada centímetro do bairro chique do Rio. Uma eleitora tucana, que diz votar em Lula, mordeu e arrancou o dedo de uma petista. Criaram a antropofagia eleitoral
Lulinha - a oposição tentou expor um dos cinco filhos do presidente Lula, Fábio Luís Lula da Silva. Tornou-se sócio de uma empresa milionária. Aos pais, que questionam o sucesso de Lulinha, o presidente responde: “Por que meu filho não é o Ronaldinho? Porque não pode todo mundo ser o Ronaldinho.”
M
Mensalão - neologismo criado pelo ex-deputado Roberto Jefferson. Parlamentares receberiam comissões para apoiar o governo Lula. Empresas de Marcos Valério pagavam direta ou indiretamente a políticos aliados
Mensalinho - derrubou o ex-presidente da Câmara Severino Cavalcanti (PP-PE), que renunciou ao mandato por ter cobrado propinas de um dono de restauranteNNossa Caixa - o banco estatal paulista foi investigado por suspeita de direcionamento de recursos de publicidade pelo governo Alckmin para favorecer deputados estaduais
O
Okamotto - o amigo generoso de Lula, que pagou uma dívida de R$ 29,4 mil do presidente sem o conhecimento do próprio, na versão dele
Orçamento - corta ou não corta, eis a questão que ficou para 2007. Na reta final, o PT afirmou que o PSDB ia reduzir investimentos em programas sociais. Os tucanos morderam a isca
P
PCC - a facção criminosa parou a capital paulista, seqüestrou um jornalista da TV Globo e virou munição eleitoral e sinônimo de insegurançaPrivatista - rótulo que os petistas colaram em Alckmin. Em vez de defender as privatizações no governo FHC, o tucano tentou se livrar do incômodo rótulo vestindo uma jaqueta com as marcas Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Correios e Petrobrás
Q
Quarenta - o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, concluiu que o mensalão era operado por uma “sofisticada organização criminosa”, comandada pelo PT. Entre os 40 denunciados, políticos e empresários. O ex-ministro José Dirceu era o chefe e José Genoino, Delúbio Soares e Silvio Pereira seriam os integrantes do núcleo principal da quadrllha
R
Rural - é o banco do mensalão, onde deputados e seus assessores sacavam dinheiro depositado por Marcos Valério e companhiaSSanguessugas - nome da operação da Polícia Federal que desmontou a quadrilha que fraudava a venda de ambulâncias de diversos Estados. Desmoralizou, de vez, a imagem do Congresso, com o envolvimento de 84 parlamentares
Sindicalistas - Ricardo Berzoini, Oswaldo Bargas, Expedito Afonso Veloso, Hamilton Lacerda, Jorge Lorenzetti, nomes da vez da última crise petista. Ex-companheiros de Lula dos tempos de sindicato
T
Traição - o mistério dos mistérios. Lula nunca disse quem são as pessoas que o traíram, se de seu partido ou da oposiçãoTransposição - a promessa de campanha de Lula, de levar água do Rio São Francisco para o semi-árido nordestino, secou. O governo não perdoa o bispo d. Luiz Flávio Cappio, que fez uma greve de fome contra a obra
U
Udenista - ao longo da campanha, petistas passaram a definir os tucanos e pefelistas como udenistas, numa tentativa de ligá-los à imagem de golpistasVValerioduto - neologismo criado para definir de onde vinha a dinheirama que irrigou o pagamento do mensalão. Criado pelos tucanos mineiros, com ajuda do publicitário Marcos Valério, foi adotado pelos petistas para comprar o apoio de parlamentares no Congresso
V
Vedoin - ou como uma família de empresários resolve obter lucro fácil cooptando políticos à base de comissões de 10%
Vestidos - presentes (de grego) de um estilista à então primeira-dama, Lu Alckmin, os 40 (ou 400?) vestidos viraram um prato cheio para a oposição. Alckmin disse que ela errou
X
Xadrez - o ex-prefeito paulistano Paulo Maluf teve o infortúnio de ser preso, acusado de corrupção passiva, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e remessas ilegais. Atrás das grades, afirmou ser um “preso político”. Mesmo assim, disputou as eleições: foi o deputado mais votado do País
Z
Zé Dirceu - ex-homem forte de Lula, saiu do governo na primeira ameaça: “Se não sair daí rápido, você vai fazer réu um homem inocente”, bradou Roberto Jefferson. Agora é blogueiro

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